A homologação do acordo extrajudicial e suas repercussões no processo do trabalho
por Sérgio Rocha Pombo
Em meio a uma turbulência legiferante, com um Congresso Nacional desacreditado e um presidente da república envolvido em denúncias de corrupção, surge a Lei n. 13.467, publicada no dia 13 de julho de 2017, também chamada de Reforma Trabalhista.
A reforma era necessária, porém veio na hora errada e em um momento muito crítico para a sociedade brasileira. Não houve debate entre os atores sociais envolvidos e que seriam os destinatários do novo diploma legal. Sendo assim, o texto que foi aprovado em regime de urgência e, portanto, de forma açodada, carece de boa técnica legislativa e contém muitas impropriedades e até mesmo algumas contradições.
Abordaremos, neste sucinto ensaio alguns pontos da Lei 13.467/2017, que tiveram como escopo a introdução da jurisdição voluntária na Justiça do Trabalho com a criação da homologação do acordo extrajudicial.
Apontaremos nossa impressão sobre o tema, obviamente sem querer esgotar o assunto, que ainda está sendo construído e que vai desafiar o poder de exegese da doutrina e principalmente uma construção segura por parte da jurisprudência.
Processo de Jurisdição Voluntária para Homologação de Acordo Extrajudicial
O legislador reformista inovou ao criar o processo de jurisdição voluntária na Justiça do Trabalho. Tal novidade vai exigir uma certa dose de criatividade e boa-fé dos operadores deste instituto para fazer com que a novidade processual seja útil e eficaz para a pacificação dos conflitos entre capital e trabalho. Isso porque, os acordos extrajudiciais, que não eram permitidos até a entrada em vigor da Lei 13.467/17, podem abrir margem para fraudes, como tem ocorrido com as chamadas “lides simuladas”.
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero aduzem que, “se demandante e demandado se servem do processo para praticar ato simulado ou conseguir fim proibido por lei, então há simulação e há fraude à lei, havendo uso ilegal do processo”.
É importante trazer a lume o intenso combate que o Ministério Público do Trabalho sempre travou contra esses atos simulados, conhecidos no meio empresarial como “ação casada”, nas quais o empresário dispensava o trabalhador sem o pagamento das verbas rescisórias, ou então com um pagamento módico. Depois sugeria que o ex-empregado procurasse um advogado, de preferência indicado pelo próprio empregador. E assim simulavam uma demanda judicial que seria objeto de acordo futuro perante a Justiça do Trabalho.
Com este procedimento elaboravam uma petição inicial e ajuizavam a ação, aguardando então a citação da reclamada para que comparecesse em juízo. Na audiência inicial o acordo já estava pronto, aliás, estava pronto antes mesmo da formalização da petição de ingresso. O reclamante então aceitava o valor proposto pela empresa e dava quitação geral ao contrato, outorgando ao empregador a eficácia da coisa julgada material, impedindo a discussão de qualquer outra verba relacionada ao contrato de trabalho havido entre as partes.
Com o escopo de evitar este litígio aparente, que poderia gerar problemas para o empregado, empregador e até mesmo aos advogados envolvidos é que o legislador reformista criou a figura da jurisdição voluntária no processo do trabalho.
Aqui se faz necessária uma breve explicação. Conforme ensinamento do magistrado paulista, Mauro Schiavi, a jurisdição se divide entre contenciosa e voluntária. Contenciosa é aquela que pressupõe a existência de lide, atua de forma imperativa, dirime o conflito e impõe coercitivamente o cumprimento da decisão. De outro lado temos a chamada jurisdição voluntária que é a administração pública de interesses privados, ou seja, o poder judiciário dá validade ao negócio jurídico entre particulares que, pela sua importância e seriedade de que se reveste o ato, necessita da chancela judicial.
Manoel Antonio Teixeira Filho afirma que essa “suposta jurisdição” nada mais é do que a administração pública atuando diante de interesses privados, recebendo a chancela do Judiciário.
A Lei n. 13.467/2017 introduziu um novo capítulo na CLT, Capítulo III-A, Do Processo de Jurisdição Voluntária para Homologação de Acordo Extrajudicial. Cujo artigo 855-D traz a seguinte redação:
Art. 855-B. O processo de homologação de acordo extrajudicial terá início por petição conjunta, sendo obrigatória a representação das partes por advogado.
§ 1o As partes não poderão ser representadas por advogado comum.
§ 2o Faculta-se ao trabalhador ser assistido pelo advogado do sindicato de sua categoria.
Pela análise do texto acima mencionado, salvo melhor juízo, identificamos algumas imprecisões técnicas do legislador, as quais gostaríamos de compartilhar com nosso leitor. Vejamos:
Considerando a criação da via da Jurisdição Voluntária para a homologação de acordos perante a Justiça do Trabalho, será que podemos falar de “processo de jurisdição voluntária”? Para responder a essa pergunta devemos lembrar que na chamada jurisdição voluntária não há atividade jurisdicional, mas sim mera atividade de administração pública de interesses privados, portanto não há “processo”, mas sim, “procedimento”. Da mesma forma não podemos chamar os atores envolvidos no dito procedimento de “partes”, pois não há litígio, mas sim “interessados”, pois temos a convergência de interesses comuns entre empregado e empregador, sendo que tais interesses serão levados ao juiz para a devida chancela a qual o artigo 855-B chama de “homologação de acordo extrajudicial”.
Para que sejamos mais claros, nos valemos novamente das lições do professor Teixeira Filho para quem “o vocábulo processo significa o método ou técnica de que se utiliza o Estado para solucionar conflitos de interesses ocorrentes entre os indivíduos ou as coletividades, ou entre uns e outros”.
Sendo assim, podemos concluir que em razão da convergência de interesses entres os envolvidos na transação a ser homologada pelo juízo, não teremos “processo”, mas, tão somente um “procedimento”. Porém, apesar de tratar-se apenas de um procedimento, por ter repercussão social relevante, necessita da submissão à jurisdição.
Requisitos Legais para o Procedimento
Pelo que se extrai da dicção do citado artigo 855-D da CLT, o procedimento terá início com a petição inicial conjunta dos interessados, sendo que a lei exige que cada qual esteja representado pelo seu próprio advogado, sendo proibida a representação dos respectivos partícipes por advogado comum.
Neste aspecto é de fundamental importância destacar que o legislador criou um ônus adicional para o trabalhador, pois eliminou de forma absoluta a figura do jus postulandi para este tipo de procedimento.
A capacidade postulatória do trabalhador, característica marcante do Direito Processual do Trabalho, fica prejudicada neste procedimento, pois, nos termos da lei, será obrigatória a presença do advogado. Entendimento este que se coaduna com o art. 133 da Constituição Federal, que preceitua ser o advogado indispensável à administração da justiça.
Somos da opinião que o legislador andou bem em condicionar a homologação do acordo extrajudicial à presença de advogados para representar os interessados, tanto para o empregado quanto para o empregador. Máxime em relação ao trabalhador, que por ser hipossuficiente, poderá ter os seus direitos básicos sonegados caso fique a mercê dos interesses exclusivos do empregador.
Não há que se falar em capitis diminutio em relação a capacidade postulatória das partes no processo do trabalho, mesmo porque, a Súmula n. 425 do TST já limitava essa possibilidade, conforme se observa do texto abaixo:
O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.
Distribuída e autuada a petição inicial os autos irão conclusos ao juízo de primeiro grau, que verificará o cumprimento dos requisitos legais do procedimento, bem como se não há vícios de consentimento, se as parcelas objeto do acordo estão devidamente especificadas com a indicação de sua natureza, as datas e prazos para pagamento, caso haja parcelamento na transação, o alcance da quitação a ser outorgada tanto ao empregado quanto ao empregador.
Com os cuidados acima, dentre outros que ficarão ao critério do juiz que decidirá, de acordo com o caso concreto, o procedimento estará pronto para ser homologado. Observe que o art. 855-D da CLT esclarece o tempo e a forma como o juiz deverá agir: “no prazo de quinze dias a contar da distribuição da petição, o juiz analisará o acordo, designará audiência se entender necessário e proferirá sentença”.
Uma questão instigante desafia nosso entendimento. Considerando que o texto legal determina que o juiz, se entender necessário, designará audiência, questionamos: poderá o juiz ouvir testemunhas nessa audiência ou determinar a realização de perícia? Afirmamos que não, pois o novel procedimento de que estamos a tratar não tem as características dos clássicos litígios trabalhistas, mas sim de interesses privados que convergem. Em razão disso se conclui que a realização de uma audiência de instrução ou eventual perícia seria completamente desarrazoado.
Aqueles que comparecem na audiência designada pelo magistrado estão buscando uma pacificação dos conflitos pessoais, com a chancela definitiva do poder judiciário. Sendo assim e considerando a inexistência de lide ou disputa entre partes, não faz nenhum sentido a oitiva de testemunhas por parte do juiz que vai homologar a conciliação e muito menos a exigência de “prova” pericial, pois incompatível com o prazo e com o objetivo do novo mecanismo de solução de conflitos.
A homologação do acordo se dará mediante sentença proferida pelo magistrado. Desta forma, o juiz observará os termos do art. 831 da CLT e, portanto, deverá a decisão ser fundamentada sob pena de nulidade, na forma do art. 93, X, da CF, e estará sujeita a interposição de Embargos de Declaração, se estiverem presentes os requisitos da omissão, obscuridade e contradição, bem como será cabível Recurso Ordinário no prazo legal.
Destacamos que eventual Embargo de Declaração ou medida recursal somente será cabível caso a homologação se dê de forma parcial ou fora dos termos que foram postulados pelos interessados quando do protocolo da petição inicial que inaugurou o processo de jurisdição voluntária contemplado no art. 855-D da CLT.
Distribuída e autuada a petição inicial os autos irão conclusos ao juízo de primeiro grau, que verificará o cumprimento dos requisitos legais do procedimento, bem como se não há vícios de consentimento, se as parcelas objeto do acordo estão devidamente especificadas com a indicação de sua natureza, as datas e prazos para pagamento, caso haja parcelamento na transação, o alcance da quitação a ser outorgada tanto ao empregado quanto ao empregador.
Com os cuidados acima, dentre outros que ficarão ao critério do juiz que decidirá, de acordo com o caso concreto, o procedimento estará pronto para ser homologado. Observe que o art. 855-D da CLT esclarece o tempo e a forma como o juiz deverá agir: “no prazo de quinze dias a contar da distribuição da petição, o juiz analisará o acordo, designará audiência se entender necessário e proferirá sentença”.
Uma questão instigante desafia nosso entendimento. Considerando que o texto legal determina que o juiz, se entender necessário, designará audiência, questionamos: poderá o juiz ouvir testemunhas nessa audiência ou determinar a realização de perícia? Afirmamos que não, pois o novel procedimento de que estamos a tratar não tem as características dos clássicos litígios trabalhistas, mas sim de interesses privados que convergem. Em razão disso se conclui que a realização de uma audiência de instrução ou eventual perícia seria completamente desarrazoado.
Aqueles que comparecem na audiência designada pelo magistrado estão buscando uma pacificação dos conflitos pessoais, com a chancela definitiva do poder judiciário. Sendo assim e considerando a inexistência de lide ou disputa entre partes, não faz nenhum sentido a oitiva de testemunhas por parte do juiz que vai homologar a conciliação e muito menos a exigência de “prova” pericial, pois incompatível com o prazo e com o objetivo do novo mecanismo de solução de conflitos.
A homologação do acordo se dará mediante sentença proferida pelo magistrado. Desta forma, o juiz observará os termos do art. 831 da CLT e, portanto, deverá a decisão ser fundamentada sob pena de nulidade, na forma do art. 93, X, da CF, e estará sujeita a interposição de Embargos de Declaração, se estiverem presentes os requisitos da omissão, obscuridade e contradição, bem como será cabível Recurso Ordinário no prazo legal.
Destacamos que eventual Embargo de Declaração ou medida recursal somente será cabível caso a homologação se dê de forma parcial ou fora dos termos que foram postulados pelos interessados quando do protocolo da petição inicial que inaugurou o processo de jurisdição voluntária contemplado no art. 855-D da CLT.
Ação Rescisória ou Anulatória?
Uma vez homologado o acordo e transitada em julgada a decisão judicial, a quitação outorgada aos interessados será irrecorrível e produzirá os efeitos da coisa julgada, sendo que nos termos do que dispõe a Súmula 259 do TST, a matéria somente poderá ser rediscutida mediante propositura de ação rescisória.
“só por ação rescisória é impugnável o termo de conciliação previsto no parágrafo único do art. 831 da CLT”.
Em que pese o entendimento já cristalizado do TST, em relação ao cabimento da ação rescisória para impugnar os casos de homologação de conciliação em reclamatórias trabalhistas, com a devida vênia, ousamos discordar que essa medida é adequada para os casos do novo acordo extrajudicial.
O novo Código de Processo Civil, aplicável de forma subsidiária ao processo do trabalho, consagrou em seu artigo 966, § 4º, o cabimento de ação anulatória para os casos análogos ao que ocorre na jurisdição voluntária trabalhista. Vejamos:
“§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.”
Observa-se que paira sensível diferença entre a homologação do acordo extrajudicial e a conciliação celebrada na clássica ação trabalhista.
Na primeira não há litígio e nem conflito, mas sim a comunhão de interesses e vontades no sentido obter a pacificação entre os interessados com a obtenção da chancela judicial.
Na segunda há pretensão resistida, ou seja, o conflito de interesses entre as partes já está instaurado e a conciliação tem por escopo dar fim ao litígio através da celebração de ajuste entres as partes através de concessões mutuas e recíprocas.
Assim sendo e apontadas as respectivas diferenças, podemos afirmar que em se tratando de homologação de conciliação decorrente de reclamatória trabalhista, a medida cabível para impugnar tal decisão, que tem efeito de sentença irrecorrível, seria a ação rescisória (Súmula 259 do TST).
Por outro lado, tratando-se de homologação de acordo extrajudicial, que tem origem em procedimento de jurisdição voluntária através de petição conjunta formulada por ambos os interessados, a medida judicial cabível para desconstruir o efeito da coisa julgada seria a ação anulatória (CPC, art.966, § 4º).
Temos esperança que em breve esta polêmica seja dissipada através de um posicionamento claro e definitivo por parte do Tribunal Superior do Trabalho.
Recusa da Homologação do Acordo
Uma vez homologado o acordo, da forma como foi celebrado pelos interessados, o procedimento produzirá os seus efeitos e será arquivado. Entretanto consequência jurídicas e processuais surgirão caso o magistrado se recuse a homologar a transação entabulada entre empregado e empregador.
Considerando o cenário da não homologação do acordo, os interessados poderão recorrer, em petição conjunta, da decisão. Na hipótese de somente um dos interessados recorrer, entendemos ser caso de formação de litisconsórcio necessário em relação ao outro.
Ao empregado há mais uma saída, qual seja, o ajuizamento da clássica ação trabalhista em face do empregador no sentido de buscar os direitos que lhe foram sonegados e que motivaram a tentativa conciliatória.
Destacamos, por oportuno, que o reclamante poderá postular em juízo todos os direitos decorrentes do contrato havido com o seu empregador e não somente aqueles que foram objeto da tentativa frustrada de acordo, desde que respeitado o prazo prescricional.
Pelo motivo acima explicitado, pode ser questionável o verdadeiro interesse processual do trabalhador em buscar a via do Recurso Ordinário para discutir a decisão de primeiro grau que recusou a homologação do acordo entabulado. Pois, se o trabalhador permanece com o seu direito hígido de buscar a solução do conflito pela via judicial, por que razão iria querer recorrer da decisão que indeferiu o pedido de homologação?
Somos da opinião que existe sim interesse processual do trabalhador, pois a via crucis de uma reclamação trabalhista, levaria o empregado a esperar meses ou anos por uma decisão judicial, que pode concluir que o reclamante não tem direito algum. Sendo que, insistir na homologação do acordo judicial lhe assegura a certeza do direito transacionado e o valor que receberá, caso o acordo seja integralmente cumprido pelo empregador.
A situação do empregador é diferente, pois a ele caberia apenas a opção de interposição do Recurso Ordinário contra a decisão que rejeitou o pleito de homologação do acordo, não tendo como ajuizar ação judicial em face do trabalhador para obter qualquer tipo de tutela, salvo nos casos excepcionais em que o empregador é credor do empregado, matéria que poderá ser objeto de medida reconvencional ou futura ação trabalhista.
Fase Recursal
Uma vez admitida a possibilidade de cabimento de recurso ordinário contra a decisão judicial que não homologou o acordo celebrado entre os interessados, resta estabelecer como esse novo procedimento deve ser analisado.
Prima facie, questiona-se: haverá depósito recursal? Afirmamos que não! Tendo em vista que a natureza jurídica da decisão que não homologa o acordo é de sentença declaratória e, em razão disso, não faz qualquer sentido a exigência de depósito recursal, pois não haverá condenação em pecúnia para nenhum dos interessados.
Algumas vozes estão a sugerir o manejo do mandado de segurança contra a decisão do juiz que deixar de homologar o interesse convergente de empregado e empregador que visaram a pacificação do conflito pela via do acordo extrajudicial. Não compartilhamos deste entendimento. No caso em análise não se identifica direito líquido e certo dos interessados que desafie a utilização da ação mandamental.
Nesse passo caminha a jurisprudência cristalizada pela Súmula 418 do TST: “a homologação de acordo constitui faculdade do juiz, inexistindo direito líquido e certo tutelável pela via do mandado de segurança”.
Como se observa não há outra alternativa a não ser a utilização de recurso ordinário para se buscar a homologação do acordo que fora recusada pelo juízo a quo, que sob nossa ótica poderá ser interposto através de petição conjunta das partes, conforme já dito, desde que obviamente representada cada um pelo seu próprio advogado, nos termos exigidos pelo novel art. 855-B da CLT.
Retomemos a ideia do litisconsorte. Na hipótese de haver somente recurso de um dos interessados, o outro interessado deverá ser admitido no processo nessa fase recursal, pois, a decisão do Tribunal irá beneficiar ou prejudicar ambos de forma idêntica.
Este também é o pensamento do prof. Manoel Antônio Teixeira Filho:
Se apenas uma delas recorrer, a outra deverá ser admitida como litisconsorte unitária, uma vez que a decisão a ser proferida pelo tribunal deverá ser uniforme para as partes. Não poderia à evidencia, o tribunal declarar que o acordo seria válido, digamos, para o empregador, mas inválido para o trabalhador.
Uma vez interposto o recurso ordinário, não haverá abertura de prazo para contrarrazões, pois como já dissemos alhures não há lide, não há direito resistido e há o litisconsórcio necessário. Empregado e empregador convergem sobre todos os pontos levado para a homologação judicial, em razão disso não nos parece razoável qualquer argumento que se possa usar nas contrarrazões do recurso ordinário.
Uma vez analisados os requisitos intrínsecos e extrínsecos do apelo interposto, o tribunal poderá conhecer do recurso ordinário e dar provimento no sentido de homologar o acordo celebrado entre empregado e empregador. Por óbvio, caso o TRT esteja de acordo com a decisão de primeiro grau, conhecerá do recurso, mas negará provimento, mantendo a decisão que recusou a homologação almejada pelas partes interessadas.
Suspensão da Prescrição
Antevendo a possibilidade de que o acordo pudesse deixar de ser homologado o legislador preocupou-se em garantir a paralisação da contagem do prazo prescricional. Vejamos:
Art. 855-E. A petição de homologação de acordo extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela especificados.
Parágrafo único. O prazo prescricional voltará a fluir no dia útil seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que negar a homologação do acordo.
O referido artigo, também traz uma imprecisão técnica. Como já alertou o professor Manoel Antonio Teixeira Filho, o que suspende a fruição do prazo prescricional não é a “petição” de acordo, mas sim o efetivo “protocolo” dela. São detalhes que nada mudam em relação ao procedimento, mas ilustra o modo apressado como o texto foi redigido, sem compromisso com a boa técnica legislativa.
Alertamos no sentido de que apenas os direitos especificados na petição de acordo suspendem o prazo prescricional, sendo que os direitos que por ventura não foram objeto de discriminação no corpo da petição que deflagra o procedimento, não serão alcançados pela dita suspensão fluindo normalmente a contagem do seu prazo.
Diante deste cenário, em caso de não homologação do acordo extrajudicial, poderemos ter dois tipos de prazos prescricionais para serem observados, sendo o primeiro deles oriundos dos direitos elencados no corpo da petição inicial e que foram atingidos pela suspensão decorrente do protocolo que objetivava a celebração do acordo. E de outro lado o rol de direitos que não foram discriminados no texto da exordial e que, por consequência, não se beneficiaram da suspensão mencionada no art. 855-C da CLT.
Uma vez suspensos os prazos, pelo protocolo da petição do acordo, voltarão a ter continuidade a partir do trânsito em julgado da sentença que recusar a homologação.
Considerando as questões que envolvem a contagem do prazo prescricional, os advogados de trabalhadores devem estar bem atentos em relação aos itens que vão compor o termo de acordo a ser levado à homologação judicial. Haja vista que não se tem certeza em relação a homologação ou não do ajuste, deve-se ressalvar a maior quantidade de direitos que possam ser objeto de futura ação judicial em caso de recusa da homologação, sob pena de que a suspensão da prescrição, de que trata o art. 855- E supra, tenha alcance limitado beneficiando apenas alguns poucos direitos elencados na inicial da conciliação entabulada.
Alcance da Quitação Outorgada pela Homologação do Acordo Extrajudicial
Um dos pontos polêmicos do novo procedimento de jurisdição voluntária é a abrangência e o alcance da quitação outorgada pelo juízo que homologa o acordo extrajudicial. Alguns entendem que a quitação a que se refere o novo texto legal abrangeria tão somente as parcelas discriminadas na petição inicial. Outros afirmam que a quitação é total e abrangeria todo o contrato de trabalho.
A Lei 13.467/2017 não impôs nenhum tipo de limitação material ao acordo extrajudicial. Sendo assim, são absolutamente amplos os temas e valores a serem levados à analise e posterior homologação da Justiça do Trabalho.
A partir desta perspectiva de que “o céu é o limite” para a nova jurisdição voluntária, caberá aos juízes do trabalho muita sensibilidade, parcimônia e análise criteriosa, principalmente sobre o alcance e extensão da quitação a ser outorgada, bem como se é o caso de homologar ou recusar a homologação que for submetida ao seu crivo.
Neste sentido é importante destacar que nos termos do que dispõe o artigo 178 do Código de Processo Civil, sempre que estiver presente interesses de menores - situação muito comum em ações envolvendo acidente de trabalho com morte - se faz necessária a intimação do Ministério Público do Trabalho para que possa intervir como fiscal da ordem jurídica, nas hipóteses em que a lei lhe assegura a necessária e indispensável participação do parquet, sob pena de posterior nulidade do acordo extrajudicial que venha a ser homologado.
Outra questão que na prática tem gerado muita polêmica nas varas do trabalho e tribunais regionais é a situação da homologação parcial do acordo entabulado entre empregado e empregador.
Neste sentido é importante que se destaque notícia veiculada em 19 de outubro de 2019, no site Consultor Jurídico dando conta que no caso de acordo extrajudicial, não cabe ao judiciário questionar a vontade das partes envolvidas e nem o mérito do que foi acordado, pois de acordo com o TST, a atuação da Justiça do Trabalho deve ser binária: homologar ou não o acordo.
“De acordo com o ministro Ives Gandra Martins da Silva Filho, do Tribunal Superior do Trabalho, o Judiciário só tem duas opções nesses casos: homologar ou não homologar o acordo. "Não lhe é dado substituir-se às partes e homologar parcialmente o acordo se este tinha por finalidade quitar integralmente o contrato de trabalho extinto”, afirmou.”
Na decisão da 4ª Turma do TST ao julgar o Recurso de Revista RR-1000015-96.2018.5.02.0435, o ministro Ives Gandra observou que o artigo 855-B da CLT e seus parágrafos 1º e 2º, traçaram as balizas para a apresentação do acordo extrajudicial passível de homologação: petição conjunta dos interessados e advogados distintos. Dessa forma, no seu entendimento, a petição assinada conjuntamente para o requerimento da homologação ao juiz demonstra a anuência mútua dos interessados em encerrar o contrato.
Na visão do ministro relator, não cabe ao judiciário questionar a vontade das partes envolvidas ou o mérito do foi acordado se estiverem presentes os requisitos gerais do negócio jurídico e os requisitos específicos previstos na lei trabalhista.
Diante da celeuma que se instaura em relação ao alcance da quitação, somos da opinião que tudo vai depender da forma como a petição de acordo seja redigida e levada a juízo. Caso os interessados elaborarem o rol dos direitos que são objeto da transação e nada mencionarem a respeito dos direitos que não foram elencados no texto, a quitação dada pelo juízo alcançará tão somente os direitos decorrentes dos itens descritos no acordo.
Todavia, se os requerentes ajustarem que a transação levada a juízo outorga quitação geral e recíproca em relação a todo o contrato de trabalho ou da relação havida entre as partes, pensamos que a quitação é total e definitiva, não podendo mais ser invocado qualquer direito em ação futura, seja por parte do empregado seja por parte do empregador, não cabendo ao judiciário interferir em relação a homologar parcialmente o ajuste pactuado previamente.
Considerações Importantes para a Advocacia
Um dos pontos que vai exigir reflexão por parte daqueles que militam na Justiça do Trabalho é o seguinte: quanto cobrar do cliente a título de honorários advocatícios para atuar perante a nova jurisdição voluntaria? A questão é instigante.
Poderia o advogado cobrar de 20% a 30% do benefício obtido pelo seu cliente reclamante para a confecção de uma petição de acordo e acompanhamento em eventual audiência?
Por outro lado, caso o advogado cobre um pequeno valor apenas para acompanhar o trabalhador na atípica audiência do art. 855-D, o referido causídico não poderia ser denunciado por seus pares pela cobrança de honorários módicos?
Não temos respostas para essas indagações. O tempo se encarregará de nos mostrar o melhor caminho e ajudará a corrigir as distorções e os exageros.
Considerações finais
Como destacado no início do nosso ensaio, a Reforma Trabalhista era necessária, mas o legislador pecou quando optou por não consultar os atores sociais envolvidos e que serão diretamente atingidos pelas alterações legislativas.
Relativamente a criação da jurisdição voluntária para a homologação do acordo extrajudicial, queremos acreditar que o novo instituto será uma ferramenta eficaz de pacificação de conflitos entre empregados e empregadores. Afirmamos isso pelo fato de que patrões e trabalhadores, historicamente, sempre se recusaram a negociar antes de instaurado o litígio, justamente pela ausência da segurança jurídica sobre eventual ajuste celebrado. Quem paga, quer quitação ampla e definitiva e isso não era possível sem que o judiciário fosse acionado pela via da reclamação trabalhista.
Outro aspecto relevante a ser comemorado é a diminuição, e quiçá a extinção, da odiosa prática da lide simulada para a obtenção da quitação com a eficácia liberatória em relação ao contrato de trabalho.
É certo que os interessados deverão se utilizar desta novidade processual na Justiça do Trabalho de forma ética, responsável e principalmente zelando pelo cumprimento de todos os requisitos legais conferidos pelo legislador.
Apenas o decorrer do tempo será capaz de mostrar se as opiniões aqui expostas se concretizarão e se, de fato, as mudanças, neste particular, serão benvindas.