Aplicação da Lei 14.151/2021: quem paga pelo afastamento das gestantes?
por Danielle Blanchet e Vitor Furlan Menezes
Como medida de prevenção e controle da pandemia do COVID-19, foi editada em maio deste ano a Lei 14.151/2021, que determina o afastamento das gestantes das atividades presenciais durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, garantindo-lhes as mesmas condições de remuneração percebidas até então. A medida surge com a intenção de preservar a exposição das gestantes ao vírus diante do altíssimo risco apresentado pelo grupo a partir do 3º trimestre de gestação, porém não há distinção legal sobre o momento de afastamento. Portanto, o procedimento deve ser estendido a todas as grávidas, independentemente do período de gestação.
Frente as novidades da Lei 14.151/2021 diversas dúvidas surgiram ao empregador, principalmente no que diz respeito a funções em que não há possibilidade de o trabalho ser realizado de forma remota. É o caso de diversas empresas ligadas ao ramo da saúde, por exemplo.
Como alternativa, algumas empresas se apegaram ao texto da MP 1.045/2021 (praticamente uma reprodução da MP 927/2020), que permite a suspensão dos contratos de trabalho e atribui ao Estado a responsabilidade pelo pagamento de boa parte dos rendimentos das empregadas.
Contudo, a referida MP perde sua vigência em 25/08/2021 e as empresas voltam à dúvida inicial: quem paga a conta pelo afastamento compulsório das gestantes em atividades cujo o trabalho remoto é inviável?
A lei é omissa nesse aspecto (assim como em vários outros), o que tem levado parte dos empregadores ao ajuizamento de ações na Justiça Federal, requerendo que a responsabilidade pelo pagamento dos salários seja atribuída ao INSS, notadamente quando há impossibilidade de ativação da gestante nos termos exigidos pela Lei nº 14.151/2021.
Algumas discussões se iniciaram independentemente do que previu a MP 1045, como é o caso de duas ações específicas propostas no Estado de São Paulo.
Em uma delas, ajuizada perante a 14ª Vara Cível Federal de São Paulo sob o nº 5006449-07.2021.4.03.6183, uma empresa que presta serviços de atendimento médico obteve êxito ao requerer o pagamento integral do salário de sua colaborada gestante pelo INSS. Na compreensão da Juíza Federal, a atividade exercida pela enfermeira de fato era impraticável, pois havia efetiva impossibilidade do seu exercício remoto. Além do mais, entendeu que imputar ao empregador todo o ônus pelo pagamento de salários nessas circunstâncias acabaria aumentando o número de dispensas e reduzindo as oportunidades de emprego para mulheres, ao invés de protegê-las.
Em outra decisão proferida no processo de nº 5003320-62.2021.4.03.6128, junto à 01ª Vara Federal de Jundiaí, o Juiz Federal aplicou de forma análoga do artigo 394-A da CLT, que já assegura à gestante o direito de receber salário maternidade – mediante pagamento pela autarquia previdenciária, portanto - quando não houver local salubre para o desenvolvimento de suas atividades na empresa.
De todo modo, esses são precedentes isolados e a jurisprudência ainda não está nem perto de uma consolidação sobre o assunto. Por isso, apesar de haver fundamentos bastante plausíveis para o ajuizamento de ações perante a Justiça Federal, ainda há o risco de que estas ações, além de demandarem tempo e dinheiro por parte das empresas, não tragam o resultado esperado, que é, de fato, a responsabilização do INSS pelo pagamento da remuneração das gestantes que não puderem trabalhar de forma remota.
Todavia, há uma “luz no fim do túnel” para os empregadores que não estiverem dispostos, neste momento, a encarar esse embate judicial. Atualmente, tramita no Congresso o Projeto de Lei 2058/2021, que visa regulamentar de forma mais específica a Lei nº 14.141/2021 e, entre outras medidas, prevê que gestantes vacinadas devem voltar ao trabalho presencial.
Essa medida ganha especial relevância se considerarmos que a vacinação das gestantes foi priorizada no plano da maioria das cidades, o que possibilitará o retorno da maior parte das colaboradoras afastadas.
Aliás, o referido Projeto de Lei passou a tramitar em regime de urgência no último dia 15/07 e já foi recebido no Plenário no último dia 03/08, transmitindo justamente a ideia de que a votação acontecerá muito em breve.
Claro que, na velocidade que esses assuntos são comumente tratados, pode ser que o Projeto não seja aprovado antes do fim da vigência da MP 1045/21, assim como pode ser rejeitado. Contudo, considerando a recente sinalização de urgência e a absoluta lacuna legislativa sobre o tema, se mostra mais assertivo aguardarmos alguns dias para vermos as “cenas dos próximos capítulos”, já que a sua aprovação pode significar o retorno imediato de boa parte empregadas que atualmente estão com o contrato suspenso ou afastadas, poupando trabalho, tempo e dinheiro com o ajuizamento de ações de alcance incerto.