Conteúdo

Impactos positivos da extensão da licença paternidade

07

ago

Impactos positivos da extensão da licença paternidade

por Danielle Blanchet

No início desse ano, a Espanha equiparou a licença paternidade à licença maternidade, de modo que ambas as licenças passaram a ser de 16 semanas, 100% remuneradas e intransferíveis.

Como divulgado em reportagem realizada pelo jornal El País , a medida ainda apresenta fragilidades, especialmente sob a perspectiva temporal, já que representam pouco tempo se comparada às licenças maternidade concedidas em outros países da Europa, mas a equiparação da licença paternidade à licença maternidade em si foi vista como um ato de vanguarda no que diz respeito ao avanço na igualdade de gênero.

Há outros países europeus que concedem licenças paternidade relativamente extensas, como Islândia e Suécia, por exemplo, porém menores do que a estabelecida recentemente na Espanha.

No Brasil, infelizmente a evolução da licença paternidade caminha a passos lentos, para dizer o mínimo, já que, atualmente, o período de licença paternidade previsto na Constituição Federal é de apenas 5 dias. Antes da Constituição, promulgada em 1988, a situação era ainda pior: a CLT previa apenas 1 dia de folga para homens quando do nascimento de seus filhos.

Em 2016 – quase 28 anos depois – foi editada a Lei nº 13.257/2016, por meio da qual passou-se a prever que a empresa inscrita no Programa Empresa Cidadã, criado pelo Governo Federal em 2008 com o objetivo de melhorar a qualidade de vida aos trabalhadores, passaria a conceder licença paternidade não apenas de 5, mas de 20 dias. Sem dúvida foi um avanço, mas ainda bastante tímido.

Hoje, existe a possibilidade de concessão de licenças maiores por liberalidade da empresa, especialmente por meio de negociação coletiva, mas essa ainda não é uma realidade, muito em virtude da mentalidade prevalente de que a responsabilidade pela criação dos filhos seria quase que integralmente da mulher, mas também porque ainda se entende, na maior parte dos casos, que os dias de ausência no trabalho geram um ônus financeiro excessivo para o empregador.

Contudo, essa visão acaba não levando em conta que a extensão da licença paternidade pode gerar outros benefícios muito relevantes e que vão além da questão meramente financeira.

A empresa Great Place to Work (GPTW), que presta serviços de consultoria e concede selo de certificação às organizações que conseguem propiciar um ambiente de trabalho de qualidade aos seus empregados, avaliou a extensão da licença paternidade como um meio hábil a permitir que os pais participem efetivamente da criação de seus filhos, principalmente nos primeiros dias ou meses de vida – sem dúvida os mais desafiadores - sem a necessidade de se preocuparem com atividades de trabalho. Também destaca que essa condição serviria como estímulo para que esses pais retornem ao trabalho muito mais dispostos, mais focados e menos propensos a cometerem erros por preocupação com o filho recém-nascido.

Esse benefício poderia, inclusive, servir como meio de retenção de talentos, além de causar um impacto absolutamente positivo na imagem da empresa perante seus clientes e no próprio mercado profissional.

Para além da questão relacionada à produtividade, é preciso destacar que a extensão da licença paternidade também é um meio para o fortalecimento do senso de responsabilidade igualitária entre pais e mães na criação dos filhos, noção que transcende aos limites da relação entre o empregado e empregador e afeta positivamente o mercado de trabalho como um todo.

Com o reconhecimento quanto aos deveres dos pais na criação dos filhos, as mulheres passam a ter mais tempo disponível para dedicação ao trabalho e não precisam, como regra, afastar-se do mercado profissional por longos períodos, o que prejudica a sua evolução na carreira e, por consequência, a sua própria posição dentro de uma estrutura empresarial.

Saindo um pouco da questão diretamente relacionada ao mercado de trabalho, há também que se considerar que o objetivo da licença paternidade não é apenas de auxiliar a mãe no período pós parto, mas principalmente de permitir um estreitamento dos laços familiares, o que beneficia não só os pais, mas principalmente a criança, efetivando a ideia de que a proteção aos direitos da criança e do adolescente, que é assegurada pela própria Constituição, é um dever de todos e não apenas do Estado.

Além disso, o conceito de fomento ao estreitamento de laços familiares permite outras interpretações ainda mais inclusivas, como a possibilidade de concessão de licença paternidade a casais homoafetivos.

Neste sentido, ainda no último mês de julho o TRF da 04ª região, muito embora tenha negado a extensão da licença maternidade à mãe não gestante em união homoafetiva, declarou que essa mãe não gestante teria direito à licença paternidade, justamente para que pudesse acompanhar os primeiros dias de vida de seu filho .

Sob esta ótica, deixa-se de lado a perspectiva binária de que família é composta apenas por homem e mulher e passa-se a incluir e acolher famílias com outras composições. Neste ponto, os papéis sociais de pai e mãe acabam sendo interpretados em sentido amplo, muito mais relacionados à figura de cuidado, assistência, afeto e proteção dos filhos do que à perspectiva do sexo biológico.

Ainda temos um longo caminho a percorrer, especialmente no Brasil, no que diz respeito à divisão igualitária da criação dos filhos entre homens e mulheres e mais ainda no que diz respeito à legitimação e extensão de direitos a formações familiares diferentes da composição tradicional homem-mulher, mas fato é que a importância da figura do pai no âmbito da família, não apenas como genitor e provedor mas também como responsável pela criação e pelo cuidado dos filhos, tem sido cada vez mais colocada em pauta e tem gerado avanços, a exemplo dos casos concretos citados.

E só temos a ganhar com isso: pais passam a fazer parte ativamente da vida de seus filhos, mães passam a ter mais espaço no mercado de trabalho, todas as formações familiares passam a ser incluídas, reconhecidas e respeitadas, instituições passam a ter empregados cada vez mais felizes, focados e produtivos. Cenário ainda longe de se concretizar, mas começam a nascer perspectivas animadoras para as próximas gerações.

 

¹ Disponível em https://brasil.elpais.com/internacional/2021-01-01/espanha-equipara-licenca-paternidade-e-maternidade-e-avanca-na-igualdade-de-genero.html 

² Disponível em https://gptw.com.br/conteudo/artigos/significado-licenca-paternidade/ 

³ Disponível em https://www.conjur.com.br/2021-jul-25/concedida-licenca-paternidade-mae-nao-gestante-uniao-homoafetiva